“Há 14 anos, quando o meu filho nasceu, a gente não ouvia falar em autismo. Percebemos algumas diferenças no desenvolvimento, como o olhar distante, e tudo que ele fazia eu pesquisava na internet. Hoje, temos associações, políticas públicas. Não está mais fácil, mas já se consegue um melhor desenvolvimento da criança.”
A situação vivenciada pela servidora pública Andreia Melo é bem diferente da realidade dos familiares que hoje descobrem que o filho tem Transtorno do Espectro Autista (TEA). Isto porque o acesso à informação e a massificação de notícias relacionadas ao distúrbio possibilitou que as pessoas busquem direitos e desfrutem dos benefícios que são garantidos nas legislações das esferas federal, estadual e municipal.
A internet foi a grande parceira dela para descobrir por que o filho apresentava determinados comportamentos diferentes das outras crianças. “Pouco se falava na deficiência, e qualquer reação diferente eu corria para o Google. Fizemos exames fora do Estado porque aqui não fazia, e aos poucos fomos o estimulando no desenvolvimento, mas o laudo só consegui quando ele estava maior. Na época, a minha grande dificuldade era a falta de conhecimento, mas hoje já melhorou, muitos pais, logo após o diagnóstico, já conseguem os benefícios a que têm direito”, avaliou.
Mas ela ressalta que esse é um caminho que ainda precisa ser explorado, para que a população em geral saiba que o autismo existe e é uma deficiência relacionada ao comportamento da pessoa, o que nem sempre é, de imediato, visível.
“Continua sendo uma dificuldade a questão dos direitos dos autistas, como a Lei do Passe Livre. São benefícios a que eles têm direito e tem gente que não sabe. Muitos dizem que agora é ‘moda’ falar no autismo. Não se trata de modismo, mas de conhecimento, que está levando as famílias a identificarem nos filhos, e até mesmo adultos se descobrindo. Antes, se dizia que a criança era hiperativa ou então o inverso”, ressaltou.
Vinícius Melo Pinto, filho de Andreia, está fazendo o nono ano. Ela não acompanha pedagogicamente, mas são feitos exercícios multifuncionais que estimulam o desenvolvimento. “Hoje, já existem vários tipos de terapias e os próprios profissionais se aperfeiçoaram para atender os autistas, e a cada estímulo ele avança”, contou.
A Assembleia Legislativa do Estado de Roraima (ALE-RR) muito tem contribuído com a causa, aprovando leis que garantem benefícios a esse público, além de ofertar serviços no Centro de Acolhimento ao Autista (TEAMARR), que é presidido pela deputada Angela Águida Portella (PP).
O diretor do TEAMARR, Ednaldo Coelho, explicou que as pessoas buscam os serviços e ao passar por uma investigação social são orientadas com relação aos direitos assegurados em lei.
“O Centro oferece capacitação, atendimento ao autismo, acolhimento social e psicológico. Dependendo da família, a gente dá as orientações de como ela faz para tirar a carteira do autista, se tem direito ao BPC [Benefício de Prestação Continuada] e ao transporte gratuito, todos os direitos inerentes à condição do TEA”, explicou Coelho.
Ele ressaltou que todas as leis são produto da luta dos pais. “Quando o poder público assegura os direitos, é um reconhecimento do trabalho que diversas associações e grupo de pais e mães de autistas reivindicam nas casas legislativas, seja municipal, estadual ou federal”, enfatizou.
Benefícios
Os benefícios garantidos em lei vão de passe livre no transporte coletivo interestadual ao BPC. No âmbito federal, existe a Lei nº 8.899/1994, que garante passe livre às pessoas portadoras de deficiência, comprovadamente carentes, no sistema de transporte coletivo interestadual. Para isso, basta apresentar os documentos exigidos, comprovando que é autista, no guichê da empresa que presta serviço de transporte terrestre.
O autista de baixa renda também tem direito ao BPC, previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), benefício que deve ser requerido no INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social.
A ALE-RR aprovou várias leis que garantem benefícios às pessoas com TEA, e há outra em tramitação. Em vigor, existem dez leis estaduais de amparo às pessoas com autismo, começando pela transformação da Associação Roraimense da Pessoa com Deficiência e do Espectro Autista em entidade de utilidade pública.
Há a lei que obriga o poder público a fixar placas de atendimento prioritário com o símbolo do TEA, o laço colorido; a que cria o selo “Empresa Amiga dos Autistas”, a que institui a carteira de identificação do autista, a que trata da Política Estadual de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista e a que cria o programa de conscientização e obriga a inclusão e reserva de vagas na rede pública e privada de educação”.
Na esfera municipal, recentemente foi sancionada a Lei nº 2384/2023, que assegura ao autista e a um acompanhante o direito à meia-entrada (50%) nas sessões de cinema, teatro, espetáculos esportivos, shows, parques aquáticos e outros eventos culturais e esportivos realizados em Boa Vista. O município também emite a carteira do autista.
No âmbito federal, a Lei nº 12.674/12 assegura às pessoas com TEA vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer, proteção contra qualquer forma de abuso e exploração, o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às necessidades de saúde, incluindo o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo, atendimento multiprofissional, nutrição adequada e a terapia nutricional, medicamentos, informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento, além de acesso à educação e ao ensino profissionalizante, moradia, inclusive à residência protegida, mercado de trabalho, previdência social e à assistência social.
Veja abaixo as leis em vigor que foram aprovadas na ALE-RR. Para consultar o teor de cada uma, basta clicar no link:
1. Decreto Legislativo nº 2, de 9 de junho de 2021 – Declara de Utilidade Pública a Associação Roraimense da Pessoa com Deficiência e do Espectro Autista – ARPDEA e dá outras providências;
2. Lei Ordinária nº 1.579, de 13 de dezembro de 2021 – Autoriza o Governo do Estado a criar a política de diagnóstico precoce e atendimento multiprofissional para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) em Roraima;
3. Lei Ordinária nº 1.547, de 22 de novembro de 2021 – Dispõe sobre o dever de inserção do símbolo mundial da conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista-TEA nas placas de atendimento prioritário no âmbito do Estado de Roraima;
4. Lei Ordinária nº 1.707, de 21 de julho de 2022 – Dispõe sobre a criação do selo “Empresa Amiga dos Autistas”, destinado aos estabelecimentos empresariais que adotem política interna de inserção de pessoas com Transtorno do Espectro Autista no mercado de trabalho;
5. Lei Ordinária nº 1.363, de 18 de dezembro de 2019 – Dispõe sobre a utilização da musicoterapia como tratamento terapêutico complementar de pessoas com deficiência, síndromes e/ou Transtorno do Espectro Autista (TEA);
6. Lei Ordinária nº 1.306, de 3 de abril de 2019 – Institui a carteira de identificação do autista no âmbito do Estado de Roraima e dá outras providências;
7. Lei Ordinária nº 1.186, de 30 de maio de 2017 – Institui a Política Estadual de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA);
8. Lei Ordinária nº 1.103, de 16 de setembro de 2016 – Cria o programa de conscientização e obriga a inclusão e reserva de vagas na rede pública e privada de educação no Estado de Roraima para crianças e adolescentes com Transtorno do Espectro Autista e dá outras providências;
9. Lei Ordinária nº 985, de 30 de dezembro de 2014 -Proíbe a cobrança de valores adicionais ou sobretaxas para matrícula ou mensalidade de estudantes portadores de Síndrome de Down, autismo, transtorno invasivo do desenvolvimento ou outras síndromes, nas instituições de ensino públicas ou privadas e dá outras providências;
10. Lei Ordinária nº 1.288, de 22 de novembro de 2018 – Dispõe sobre a vacinação domiciliar das pessoas idosas e das pessoas com deficiência motora, multideficiência profunda com dificuldade de locomoção, doenças incapacitantes e degenerativas, com Síndrome de Down, pessoas com autismo e dá outras providências.
Texto: Marilena Freitas
Foto: Eduardo Andrade
SupCom ALE-RR